Esporte Social
O esporte tratado de forma lúdica de sociabilização e saúde.
Bate-Papo – Edição de Aniversário com ALBERTO MURRAY
O olímpismo nesse bate-papo será o assunto principal,
mas também veremos
como é ser um ativista do olímpismo em um país
que não liga a mínima ao esporte amador.
Com vocês… Alberto Murray!
ESPORTE SOCIAL: Olá Alberto, primeiramente
gostaria de agradecer
o prestígio em responder
essas perguntas, e queria dizer que sempre fui fã do s
eu trabalho. Conte-nos como foi a sua iniciação no esporte.
ALBERTO MURRAY: Eu nasci em uma família
de esportistas e vivo isso desde
que me entendo por gente.
Sempre gostei de praticar e assistir esportes.
Aprendi que o esporte
tem uma função social importantíssima
de inclusão social, como um elemento essencial para a formação
de um povo. Esporte é antes de qualquer
coisa educação. Hoje quando se fala em valores Olímpicos
as pessoas associam o assunto a dinheiro.
Olimpismo é uma filosofia de vida,
da união dos povos através da prática esportiva.
Simplesmente pedir aos povos que sejam amigos
é uma infantilidade. É preciso que gente de várias culturas,
credos, etnias se encontrem, se conheçam,
para que daí possam construir uma paz efetiva. E os Jogos Olímpicos
proporcionam isso. A juventude do mundo
se encontra a cada quatro anos para,
em minha opinião, construir um planeta melhor.
Eu comecei praticar esportes no Colégio Santo Américo,
muito cedo, aos sete anos de idade.
Jogava basquete pelo pré-mini da equipe filiada
à Federação Paulista. Aos treze anos fui para o atletismo,
no Esporte Clube Pinheiros. Tínhamos uma Equipe que
ganhava tudo, do mirim ao adulto.
Fui campeão paulista pelo Pinheiros mais de uma vez.
Em um determinado momento era o segundo do ranking
nacional na minha categoria. Competi também no esporte universitário,
ganhando algumas medalhas pela Faculdade de Direito da USP, o Largo de São Francisco.
ESPORTE SOCIAL: Como a sua família foi influente no s
eu processo de iniciação esportiva?
ALBERTO MURRAY: Absolutamente influente.
A figura do meu avô materno,
Sylvio de Magalhães Padilha, sempre foi muito marcante
em minha família. Em 1.972, com seis anos de idade,
fui aos meus primeiros Jogos Olímpicos.
E daí fui a todos os outros. Quando jogava basquete, todo
o final de semana tinha jogo cedo. Meus pais me levavam.
No Pinheiros, eu saia da escola no final da tarde e ia direito para o Pinheiros.
Treinava muito. E à noite meus pais, ou meu avô, me buscavam.
Meu avô às vezes ía assistir aos treinos
ESPORTE SOCIAL: O seu avô foi um grande esportista, como ele pensava na forma de
fazer esporte e como ele influenciou o Olimpismo no Brasil?
ALBERTO MURRAY: Meu avô era um Olimpista. Sempre ouvi dele que muito
mais importante
do que medalhas olímpicas, era bem mais importante
ter um País de praticantes de esportes, do esporte para todos. Da quantidade, dizia ele, um dia tiraríamos a qualidade.
Como Professor de Educação Física, defendia que essa disciplina deveria ter a mesma importância que as demais, na grade escolar.
Esporte para ele era educação. Não era dinheiro, não eram medalhas. Ocorre que os governos nunca deram ao esporte a atenção que merecia. O Comitê Olímpico Brasileiro não tinha dinheiro para nada. Foram algumas vezes que, para levar nossas delegações a Jogos Olímpicos, meu avô o fazia no peito e na raça. Pedia empréstimos no banco em nome próprio. Meu avô tinha ojeriza à corrupção. Muitas vezes ele expulsava de sua sala no COB gente que queria patrocinar o esporte olímpico, mas que queria o famoso “rebate”. Ou seja, gente que queria um retorno, por fora, do dinheiro que pusessem no COB. Meu avô fuzilava essa turma com o olhar. Preferia não ter dinheiro a ter que participar dessas imoralidades. O Dr. André Richer e muitos são testemunhas disso.
ESPORTE SOCIAL: Alberto, como foi o seu processo de iniciação no olímpismo, e como você definiu isso como mote de vida?
ALBERTO MURRAY: Como disse, meus primeiros Jogos Olímpicos foram aos seis anos de idade, em Munique, em 1.972. Desde então eu me interessei muito pelo assunto e ví que aquilo não era apenas uma competição esportiva, mas uma filosofia de vida.
ESPORTE SOCIAL: Como é a tarefa diária de militar a respeito do esporte, e principalmente pelo o esporte olímpico?
ALBERTO MURRAY: É muito legal. Estou fazendo algo que gosto. Ao contrapor-me ao sistema e denunciar tenho a sensação de que estou fazendo um bem ao meu País.
ESPORTE SOCIAL: Como são os trabalhos na corte arbitral do esporte?
ALBERTO MURRAY: O CAS é o Tribunal máximo de resoluções de conflitos no âmbito esportivo, sempre que estão envolvidas matérias internacionais. É um Tribunal muito sério, que atua independente. Há excelentes Advogados no CAS. Eu aprendo muito com eles.
ESPORTE SOCIAL: Como foi a sua entrada no COB, e como foi o seu começo? Quais eram os maiores desafios na época em que você entrou?
ALBERTO MURRAY: Foi em 1.996, se não me engano. Foi um convite pessoal do Nuzman. Depois disso teve gente que me disse que ele via em mim uma ameaça e que, por isso, preferia ter-me sob sua supervisão. Uma bobagem dele. Ele é uma pessoa insegura. Basta prestar atenção que Você nota logo. Em um dado momento fui convidado por acadêmicos para dirigir a Academia Olímpica Brasileira. Mas como pelos estatutos autoritários é ele quem nomeia o Presidente, ele vetou. Claro que não me disse. Soube por terceiros. Minhas ações como membro da Assembleia Geral do COB sempre foram neutralizadas. Aliás, a Assembleia é apenas uma formalidade estatutária para referendar o que ele, Nuzman, já resolveu antes com sua tropa de choque. Uma perda de tempo. O grande desafio do COB àquela altura, na medida em que estava entrando mais dinheiro do governo, era massificar o esporte. Mas isso nunca foi preocupação desta gestão.
ESPORTE SOCIAL: O COB hoje passa por diversas controvérsias a respeito do seu papel, e principalmente a distribuição dos recursos?
ALBERTO MURRAY: Sim. O COB tem muito dinheiro e fica reclamando que quer mais. Dinheiro há. O que não há é boa gestão. A distribuição das verbas da lei Piva pelo COB é absolutamente errada. O COB privilegia as Confederações mais ricas em detrimento daquelas que eles chamam de “nanicas”. Assim, o volleyball, que já tem um patrocínio monumental do Banco do Brasil, ganha a maior fatia da Lei Piva. Por outro lado, Confederações como a esgrima, o levantamento de peso, o tênis de mesa, a luta olímpica, o badminton e outras continuam de pires na mão É correto isso? Claro que não. Além do mais, o COB consome com sua própria burocracia interna cerca da metade do dinheiro que recebe da Lei Piva, para pagar salários e outras coisas. Ora, se o Nuzman diz que o COB não tem a função de formar atletas, não seria correto enxugar a estrutura do COB e repassar mais dinheiro aos Atletas?
ESPORTE SOCIAL: O COB é o principal ‘agenciador’ (digamos assim) das olímpiadas no Brasil. Como o COB está se preparando para este evento, não como responsável pela a prospecção de valores esportivos, mas sim como somente agenciador da festa inteira?
ALBERTO MURRAY: Se a organização dos Jogos Olímpicos estivesse em mãos diferentes, isso poderia ser muito bom para o Brasil. Não somente para evitar estouros financeiros, mas para deixar um legado físico e, sobretudo, cultural. Poderíamos aproveitar o evento para criar uma mentalidade Olímpica no Brasil. Mas à preocupação do COB é usar as Olimpíadas para fazer negócios, construir obras que depois serão elefantes brancos. O COB deveria estar preocupado em criar material humano. Mas isso não faz parte da cartilha deles.
ESPORTE SOCIAL: Hoje você praticamente é a única voz combativa e contestadora do COB no esporte nacional, não te surpreende que as confederações não discordem dos métodos do COB?
ALBERTO MURRAY: Não sou a única. Tem muita gente boa que contesta o COB. A maioria dos atletas e das Confederações discorda do COB. Mas não falam abertamente com medo de retaliações. O COB transformou seus estatutos em uma espécie de Ato Institucional. Ele distribui o dinheiro como quer. Possibilita intervenções nas Confederações a seu bel prazer e por tempo indeterminado. Veja a intervenção autoritária que fizeram no levantamento de peso e na vela. O artigo 16 do estatuto do COB veda que qualquer brasileiro seja candidato aos cargos de presidente e vice-presidente. Somente podem concorrer a esses cargos quem está há cinco anos nos poderes do COB. Isto na prática significa dois mandatos. E além do que há de se ter 10 (dez) Confederações apresentando uma candidatura. Em uma entidade que vice de dinheiro público, isso é jurídica e moralmente um escárnio. Se alguma Confederação falar muito contra o COB, leva paulada, perde verba. O COB é truculento com a oposição.
ESPORTE SOCIAL: Como é ser a única força combativa no esporte nacional?
ALBERTO MURRAY: Como disse, não sou a única. Há muita gente legal e séria. O Juca Kfouri, o José Cruz, o Trajano, o pessoal todo da ESPN Brasil e vários blogs, como o seu, por exemplo, têm um papel muito importante para mudar as coisas do esporte. Eu sempre brinco que se alguém me mandar algum texto de jornalista sério elogiando o Nuzman e o COB, eu dou um picolé de tangerina. Até agora nunca achei nenhum.
ESPORTE SOCIAL: O que te motiva mais nessa luta a favor do esporte, e quais as suas motivações?
ALBERTO MURRAY: O esporte virou sinônimo de negócio. O COB e o governo não dão pelota para o esporte social. Eu acho que fazer o que faço é uma forma de contribuir com o Brasil. O COB é covarde por não contestar os governos e vice versa.
ESPORTE SOCIAL: De que forma você realiza a conciliação entre a sua vida profissional como advogado com a sua reponsabilidade pessoal com o esporte?
ALBERTO MURRAY: Concilio bem. Eu viajo muito em razão da minha profissão. Tenho uma equipe e sócios fantásticos que me cobrem. Fico ligado no Blackberry 24 horas por dia. Levanto no meio da noite para responder e-mails de clientes. O esporte é uma coisa que, sem a qual, acho que não conseguiria trabalhar muito. É um incentivo para as demais atividades.
ESPORTE SOCIAL: A sua vivência no olímpismo é muito extensa, gostaria que o senhor contasse uma história que te marcou profundamente.
ALBERTO MURRAY: O mundo do esporte revela sempre grandes e novas emoções. Todas as medalhas brasileiras sempre me marcam muito. Eu sei como é difícil para um Atleta do Brasil subir ao pódio olímpico. Mas um fato que me marcou muito foi o massacre à equipe israelense nos Jogos Olímpicos de Munique, em 1.972. Eu era pequeno, mas lembro-me muito bem do dia. Foi muito tenso, muito triste. Meu avô era membro da Comissão Executiva do Comitê Internacional Olímpico. A um dado instante a Comissão Executiva ofereceu-se para ser trocada pelos Atletas reféns. Pouca gente sabe disso. Os terroristas não queriam. Eles queriam os judeus. Já sabíamos que na chegada ao aeroporto de Munique haveria uma carnificina. No dia seguinte, o culto ecumênico no estádio olímpico foi emocionalmente.
ESPORTE SOCIAL: Qual foi a sua pior derrota no esporte como dirigente?
ALBERTO MURRAY: Eu trabalhei muito no esporte universitário. A Federação Universitária Paulista de Esportes, a FUPE, ganhou um terreno da prefeitura. Mas ganhou somente o terreno. A construção do complexo esportivo deveria ser por conta da Federação. Nós íamos até o terreno e tinha lodo, mato. Sonhávamos em um dia ver ali o complexo esportivo dos universitários. Com a ajuda do Shopping Center Norte o complexo saiu do chão e virou um ponto de encontro dos desportistas universitários. O presidente da FUPE à época, Paulo Roberto Trivelli, falecido prematuramente, aos 34 anos, era um cara fantástico, inteligente, abnegado, honesto. Anos mais tarde, quando novas gerações assumiram a FUPE, fizeram tanta bobagem, utilizaram aquele terreno em benefício próprio, descumpriram o contrato com a prefeitura que lhes tomaram o terreno e tudo que lá estava construído. Não vejo isso como uma derrota, pois já havíamos deixado a FUPE fazia tempo. Mas vejo como uma grande tristeza.
ESPORTE SOCIAL: Qual é o atual momento olímpico no Brasil, e qual o futuro em aspectos como estrutura, esporte de alto rendimento e competitividade?
ALBERTO MURRAY: O atual momento do esporte do Brasil é aquilo que mencionei acima. Tem dinheiro e falta gestão competente. Pelo dinheiro público que o esporte olímpico recebe do poder executivo e das estatais, o Brasil deveria estar muito além. Mas continua patinando e as medalhas que ganhamos são naquelas modalidades que já nos dão medalhas desde a década de sessenta. Não aconteceu nada de novo. Se não houver mudanças na forma de administrar os destinos do Olimpismo, continuaremos sempre dependendo da abnegação de pessoas, de valores esporádicos para subir ao pódio.
ESPORTE SOCIAL: O Panamericano de 2007 foi o exemplo mor de sangria aos cofres públicos, onde de orçamento inicial de 400 milhões saiu por mais de 4 bilhões. O que deu errado?
ALBERTO MURRAY: Ou os organizadores são realmente muito incompetentes, ou eles realmente fizeram esse superfaturamento de má fé. Deu tudo errado. O TCU e o MP estão investigando e esperamos respostas. Não é possível que tenha havido um superfaturamento de 1.000 % e que tudo continue como está. Como diz o Antônio Roque Citadini, Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, o Nuzman é o inventor do orçamento flexível. Um truque que se pode usar é deixar tudo para a última hora, daí, apertados pelo tempo exíguo, vira obra emergencial e a coisa sai sem licitação pública por ordem do governo federal. Vamos aguardar as respostas do TCU e do MP (Ministério Público). As poucas obras esportivas que sobraram estão inúteis e não tem função social alguma. Não estão à disposição do povo. Isso é outro erro grave. É mais desesperador é ver que as mesmas pessoas que fizeram a lambança do Pan 2.007 vão querer organizar as Olimpíadas de 2.016.
ESPORTE SOCIAL: A Copa de 2014 vai ser a oportunidade do esporte nacional provar que pode ser sede de grandes eventos, ou vai ser um review requentado do Pan 07 em termos de gestão?
ALBERTO MURRAY: A Copa de 2.014 será um escândalo muito maior do que o Pan.
ESPORTE SOCIAL: Vou pedir um exercício de imaginação do senhor, como vai ser o Day After das Olimpíadas de 2016? Quais vão ser as principais notícias no dia 22 de agosto de 2016?
ALBERTO MURRAY: Manchetes como: “Ainda Falta Muito Para O Brasil Ser Potência Olímpica”; “País Tem Que Achar Função Social Para As Obras Super Faturadas” e por aí vai.
ESPORTE SOCIAL: O TCU tem apontado diversas irregularidades na gestão do Nuzman, bem como nos orçamentos do PAN 07. O que o senhor espera pra 2014 e 2016?
ALBERTO MURRAY: Se os órgãos fiscalizadores e o povo, assim como a imprensa não ficarem de olhos bem abertos, essas duas coisas juntas podem constituir-se no maior escândalo financeiro do Brasil. O dinheiro público do Brasil vai escoar pelo ralo e não haverá contra partida social. O Pan será muito pequeno perto do que pode acontecer.
ESPORTE SOCIAL: O senhor, assim como este webmaster é um opositor ferrenho do Sr. Carlos Arthur Nuzman (Presidente do COB), o que o senhor acha dele como gestor do esporte nacional, e quais foram os erros dele na sua gestão?
ALBERTO MURRAY: Nuzman tem um ego na lua. Ele não se ama, se inveja, quando se vê no espelho. Embora isso seja uma coisa que ele deveria tratar com psicólogo, acaba afetando o País, na medida em que ele é uma pessoa pública. Os grandes erros de suas sucessivas e intermináveis gestões é não saber gerir os recursos que recebe do governo, é não compartilhar com todas as Confederações um plano de longo prazo para o desenvolvimento do esporte de massa no Brasil, é querer medalhas imediatas para aparecer ao lado dos Atletas, é não estar nem aí para o lado social do esporte. Não temos um plano de desenvolvimento global do esporte, de longo prazo, embora haja dinheiro para isso. O projeto de Nuzman de transformar o Brasil em potência olímpica falhou.
ESPORTE SOCIAL: Até onde o senhor acha que o projeto de promoção pessoal dele vai chegar como presidente do COB?
ALBERTO MURRAY: Nuzman faz setenta anos daqui um ano e meio. Daí ele tem que sair do Comitê Internacional Olímpico, por idade. Ele tentou mudar as regras em Copenhagen, na Dinamarca. Mas tomou uma invertida. Assim, no CIO ele tem vida curta. Aliás, ele não é membro efetivo do CIO. Ele é membro na quota destinada aos presidentes de Comitês Olímpicos Nacionais quando da reforma estatutária do CIO. Isso quer dizer que se ele sair do COB hoje, também sai do CIO. Ele já tentou ser eleito membro da Executiva do CIO duas vezes. E perdeu as eleições. Tentou, também, aumentar o número de integrantes da Comissão Executiva do CIO. Sua proposta foi novamente derrotada. Nuzman vai tentar se segurar no COB até 2.016. Eu acho que ele deveria sair em 2.012. Em todos os Países que organizam Jogos Olímpicos, o presidente do Comitê Olímpico é um e o do Comitê Organizador é outro. Aqui no Brasil ele acumula os dois. E fica por isso mesmo. Nuzman faz o COB parecer ter um fim em si próprio.
ESPORTE SOCIAL: O esporte de alto rendimento vem sofrendo nos últimos anos para apresentação de resultados consistentes. Como o senhor vê esse atual momento do esporte nacional de alto rendimento?
ALBERTO MURRAY: Ainda dependemos de valores esporádicos, de talentos natos e de esportes que há anos, muitos anos, já dão medalhas ao Brasil. Não há qualquer planejamento de longo prazo.
ESPORTE SOCIAL: Nos mundiais, bem como nas olímpiadas tivemos uma queda significativa de número de medalhas, e uma baixa renovação, isso te preocupa e de que maneira isso pode ser solucionado ou agravado?
ALBERTO MURRAY: Enquanto o governo não entender que o esporte começa na escola, será impossível fazer o Brasil virar potência olímpica. Sou a favor da criação de uma agência reguladora do esporte nacional, que crie uma política esportiva de base, de longuíssimo prazo, que siga em frente independente dos humores dos governos. Se essa Agência existir e não for usada para barganhas políticas, pode ser uma boa opção.
ESPORTE SOCIAL: Se formos olhar com um óculos de ceticismo vemos que recursos financeiros não são problemas tão recorrentes assim para as confederações, haja vista que além dos recursos da lei Piva, tivemos alguns dos recordes de arrecadação nas loterias – a que disponibiliza, me corrija se eu estiver errado 47% de repasse -, mas porque o esporte de alto rendimento não anda?
ALBERTO MURRAY: Justamente porque não se tem um planejamento adequado para ele. A distribuição de verbas é injusta e somente ajuda a distanciar os ricos dos pobres. Igualmente, o que o COB consome com sua própria burocracia e salamaleque com dignitários estrangeiros é exagerado. Daí falta dinheiro aos esportes “nanicos”.
ESPORTE SOCIAL: De que forma pode-se exigir de um atleta um rendimento maior, e de que forma – se que é existe – pode ser criados dispositivos de cobrança aos atletas, bem como seguridade a eles em caso de contusão?
ALBERTO MURRAY: Quando o COB convoca suas seleções, há seguro para eles. Uma coisa que denunciei é que a empresa que fazia os seguros do COB era a AON Seguros, na qual um dos diretores do COB era diretor. Não posso afirmar que havia interesses pessoais aí. Mas o conflito de interesses é evidente. Não baste ser honesto. Tem que parecer honesto.
ESPORTE SOCIAL: O senhor é praticante do esporte social? E qual esporte pratica?
ALBERTO MURRAY: Corro duas Maratonas por ano. A de Paris e a de Chicago.
ESPORTE SOCIAL: A maioria das confederações não possuem artifícios para a prospecção de talentos espalhados nos rincões do Brasil, o Senhor Tem alguma alternativa para esse desperdício de talento?
ALBERTO MURRAY: Sim, dar às escolas públicas e aos professores de educação física de todo o Brasil condições de ensinar essa disciplina com dignidade. Hoje somente 12% das escolas públicas têm algum tipo de praça de esportes e ainda assim em condições muito precárias. Não existe esporte organizado no interior pobre do Brasil. Se existisse, com um projeto social sério, deixaríamos de selecionar as nossas delegações olímpicas somente em três, ou quatro Estados. Isso é um absurdo em um País com uma extensão territorial como o nosso.
ESPORTE SOCIAL: Pergunta de vestibular para o senhor: Como pode um país com aproximadamente 200 milhões de pessoas, com uma miscigenação altíssima e com uma amplitude de material genético como o nosso não conseguir se destacar em esportes olímpicos?
ALBERTO MURRAY: Pura falta de projetos sociais de longo prazo na área do esporte e prioridades equivocadas de todos os governos do Brasil, desde sempre.
ESPORTE SOCIAL: Aproveitando a pergunta anterior, o que o senhor acha desses dados?
[…] O Brasil saiu de Cingapura com 6 medalhas: 2 de ouro, 3 de prata e 1 de bronze e na 21ª posição no quadro de medalhas.
http://esportesocial.com/2010/08/28/rescaldo-jogos-olimpicos-da-juventude/Jogos Olímpicos
EDIÇÃO – OURO – PRATA- BRONZE- POSIÇÃO
Atenas 2004 5 2 3 16º lugar
Pequim 2008 3 4 8 23º lugar
Outros números:
– O Brasil levou a Cingapura a 5ª maior delegação ( 81 atletas ) sendo superado apenas pela anfitriã Cingapura ( 129 atletas ), Austrália ( 100 ), Rússia ( 96 ) e EUA ( 82 ). – Algumas potências esportivas e econômicas que ficaram a frente do Brasil ou tiveram um desempenho similar:
A frente do Brasil:
Cuba, a nossa “pedra no sapato” ( 5ª posição ), Azerbaijão ( 11ª ), Tailândia ( 14ª ), Israel ( 15ª ), Quênia ( 18ª ) e África do Sul ( 20ª ).
Superadas apenas no nº de medalhas de prata ou de bronze:
Colômbia e Etiópia ( 22ª posição empatados ), Egito e Cazaquistão ( 24ª empatados ), Irã ( 26ª ), Nigéria ( 29ª ) e Mongólia ( 32ª ).
Outros números chamam a atenção:
Países pequenos e que levaram delegações bem menores que a do Brasil, também chegou à nossa frente na classificação geral, cito três:
– Cuba, olha a nossa “pedra no sapato” aí de novo (41 atletas, ou seja, a metade da delegação do Brasil – 9 ouros, 14 medalhas no total e 5ª posição na classificação geral).
– Israel (15 atletas, três medalhas de ouro e 15ª posição).
– Quênia (11 atletas, três medalhas de ouro e 18ª posição). […]
Fonte: Esporte Social – http://esportesocial.com/2010/08/28/rescaldo-jogos-olimpicos-da-juventude/
ALBERTO MURRAY: Reflexo da absoluta falta de política esportiva de base. Se essa geração, que será a de 2.016, tivesse tido a massificação do esporte, com trabalho nas escolas, certamente os resultados seriam melhores. A solução do esporte está nas escolas.
ESPORTE SOCIAL: Como universitário há mais de 3 anos, e tendo passado por mais de 3 faculdades (FATEC, Oswaldo Cruz e FIRB) a não ser ações isoladas dos alunos nunca vi nenhum representante de qualquer movimento ligado ao esporte universitário. Na sua visão porque os universitários hoje estão mais concentrados em bares e bebidas do que na prática do esporte?
ALBERTO MURRAY: Porque as universidades também não disseminam o esporte como um fator importante. Embora seja disciplina obrigatória, o fato é que tirando aqueles que estudam esportes, ou educação física, ninguém atende às aulas. Arrumam atestados. O CEPEUSP, por exemplo, tem uma estrutura fantástica, que foi totalmente deteriorada. É uma atitude criminosa. O governo do Estado de São Paulo deveria ter como uma de suas prioridades a recuperação do CEPEUSP. As competições universitárias, que no passado eram concorridas, hoje são deprimentes. Como mencionei acima, em São Paulo, o complexo esportivo que a FUPE construiu com muito esforço, foi tomado pela prefeitura por má utilização do terreno.
As autoridades não estão nem aí para o esporte nas universidades. Assim, por falta de interesse dos dirigentes e por falta de boas condições, os alunos acabam por desinteressar-se pelo esporte.
ESPORTE SOCIAL: Qual é a sua posição em relação ao esporte universitário no Brasil, e o que o senhor acha de atletas que ‘se matriculam em universidades’ somente na época da Universia e outros torneios?
ALBERTO MURRAY: Esse tipo de “matrícula fantasma” é o chamado “gato”. Não é esporte universitário. Não ajuda em nada. O mesmo está acontecendo agora com as Forças Armadas, que criaram o “gato militar”, só para participar dos Jogos Mundiais Militares. Sou absolutamente contra esse tipo de procedimento.
ESPORTE SOCIAL: Porque mesmo os clubes tradicionais como o Pinheiros, Hebraica, Tietê não revelam grandes expoentes internacionais como antigamente?
ALBERTO MURRAY: Muitas vezes a empresa entra apoiando o esporte de forma errada. Ela cria os seus próprios “clubes”, tirando os Atletas dos clubes formadores. A função das empresas não é de formar Atletas. Isso é função dos Clubes. As empresas deveriam entrar no esporte patrocinando os Clubes e não tirando deles os Atletas. Na medida em que isso ocorre, os clubes, sem dinheiro, acabam abandonando o seu viés esportivo e passam serem clubes essencialmente sociais. Há raríssimas exceções. Quando essa empresa que formam os seus “clubes” resolve encerrar com as suas atividades esportivas, os Clubes formadores não têm mais condições de reabsorver esses Atletas e Você vê equipes desmancharem-se e Atletas desempregados. Isso acontece a toda hora no Brasil.
ESPORTE SOCIAL: Como foi essa queda de produção dos clubes e há alguma explicação pra isso?
ALBERTO MURRAY: E explicação que dei acima, aliada ao fato de os Clubes rejeitarem os Atletas experiência e militante. Acho que aquele Clube formador que vier a receber dinheiro público deve apresentar a contra partida de ter um determinado número de Atletas experiência e militante.
ESPORTE SOCIAL: O Blog do José Cruz expõe quase que semanalmente os valores de patrocínios das confederações, como explicar que o seu avô (Sylvio Padilha) mesmo 70 anos depois, com o mesmo tempo dos 110 com barreiras ficaria em 10° mesmo com todo o advento tecnológico?
ALBERTO MURRAY: Porque a evolução do atletismo no Brasil nesse período foi patética. O presidente Gesta de Mello está no poder há cerca de vinte e cinco anos e, com todo respeito, fez muito pouco pelo atletismo de massa. Ele tem uma postura paternalista, que acha que está fazendo alguma coisa porque paga a casa de um punhado de gente. Isso resolve os problemas de alguns. Mas não do esporte dele, de maneira geral. Suam permanência longa no poder o desgastou perante a opinião pública.
ESPORTE SOCIAL: Em meados do ano passado houve uma explosão de casos de doping no atletismo brasileiro, em especial com a condução do Jayme Netto (hoje endorse da Probiótica Suplementos Alimentares). Na opinião do senhor, o que houve com esses atletas?
ALBERTO MURRAY: Não convivi com esses Atletas e nunca falei com o Jayme na vida. Assim, não sei o que aconteceu com eles. Mas acho que o doping deve ser exemplarmente punido. Acho que o controle de doping no Brasil ainda é fraco. Veja o laboratório Ladetec, em que uma matéria do Jornal O Estado de São Paulo mostrou as suas dificuldades de trabalhar. É o único laboratório credenciado pela WADA no Brasil. Nas provas de rua de atletismo, pelo interior do Brasil e mesmo nas capitais, a maioria ainda não tem controle de doping. Uma vez a ONG Sylvio de Magalhães Padilha flagrou em um exame de doping no atletismo seis frascos com a mesma numeração. Nós tiramos uma fotografia dos seis frascos com a numeração igual. A Mariana Lajolo, da Folha de São Paulo, fez uma matéria exemplar. Para quem não sabe, o kit de exame tem que conter três, apenas três, frascos com numeração igual. Um para a prova, outro para contraprova e outro de reserva. Com seis frascos, pode ocorrer que o atleta dopado urine em três e outra pessoa qualquer urine nos outros três. Depois eles trocam os frascos. Os dirigentes quando viram a matéria da Mariana deram de ombros, disseram que era um “simples erro”. Eu acho isso muito grave. Seis frascos podem servir para manipulação de exames. E por mais que haja controle, isso é controlado por humanos, que estão suscetíveis à corrupção.
ESPORTE SOCIAL: Como é ser a voz combativa e destoante frente ao exército de bajuladores que tomou conta da nossa mídia?ALBERTO MURRAY: Como disse, não sou a única voz. Há gente muito melhor do que eu que ecoa muito mais longe. Eu me sinto bem fazendo isso. Acho que faço um bem para o meu País denunciando o que está errado e apontando soluções. A cartolagem não gosta e alguns tolos dizem que somos ante patriotas. Antipatriotas são eles, que em vez de lutar pelo Brasil, estão afinados com as entidades internacionais que representam.
ESPORTE SOCIAL: Qual o seu desejo para que o próximo presidente faça pelo o esporte nacional?
ALBERTO MURRAY: Um grande programa de massificação de esporte, uma política ampla absolutamente voltada para o lado social do esporte.
ESPORTE SOCIAL: De que forma o próximo presidente vai influenciar nas políticas esportivas? E o que o senhor achou dos governantes do município e do governo de são Paulo estarem com o pé atrás em relação a obras referentes à olímpiada e a copa do mundo?
ALBERTO MURRAY: O próximo presidente, ou presidenta, pode influenciar bem se fizer a tal política social do esporte. Se pegar esse programa Segundo Tempo do Ministério do Esporte, fraco e recheado de denuncias de corrupção, no lixo. Eu acho um absurdo entidades internacionais virem aqui impor suas regras. Esse assunto da FIFA é ridículo. Sempre achei que a FIFA fosse vetar qualquer estádio já existente em São Paulo porque o interesse deles é fazer obras. Se eu fosse prefeito, ou governador, teria mandado a FIFA plantar batatas e diria que São Paulo, então, ficaria fora da Copa. Mas precisa ter peito para fazer isso. E político geralmente é covarde, a não ser no horário eleitoral gratuito.
ESPORTE SOCIAL: Quais Projetos Sociais que senhor apoia além do instituto SYLVIO DE MAGALHÃES PADILHA?
ALBERTO MURRAY: Com dinheiro e tempo, somente a ONG Sylvio de Magalhães Padilha, junto com outros três diretores e mais algumas pessoas físicas e poucas empresas que contribuem. Mas nosso orçamento é baixíssimo. E não queremos dinheiro público de jeito algum. Conseguimos fazer um trabalho produtivo, na área social do esporte. Além disso, beliscamos as nossas medalhas. Obtivemos agora dois ouros no Troféu Brasil de Atletismo. Um menino da categoria infantil já está entre os vinte melhores tempos do mundo entre os juvenis, na categoria juvenil, uma acima da dele. E uma outra menina também já está na seleção brasileira juvenil. Mas o mais importante é ver a criançada aprendendo esporte e os valores reais do Movimento Olímpico.
ESPORTE SOCIAL: Quais são as principais atividades da ONG, e quais as dificuldades de se tocar um projeto dessa amplitude aqui no Brasil?
ALBERTO MURRAY: Damos formação em atletismo para crianças de Paraisópolis, Tentamos ensinar olímpismo e acho que temos obtido bons resultados. Eu não reclamos da falta de dinheiro, Nós fazemos isso porque queremos e ninguém está obrigado a ajudar. Aqueles que ajudam são muito bem vindos. Sabemos que não é fácil pegar uma criança absolutamente pobre e fazê-la ver, assim como a sua família, que o esporte é um caminho bom para a vida. Mas temos conseguido. Interessante ver como, de fato, o Estado inexiste em setores essenciais da atividade humana, dentre os quais eu incluo o esporte de base. O pobre não tem apoio de ninguém no Brasil. À elite do País também é muito insensível.
ESPORTE SOCIAL: Alberto se for de seu conhecimento, gostaria que citasse alguns projetos de atletas, ex-atletas ou pessoas que condizem projetos de esporte social para a divulgação posterior aqui no site.
ALBERTO MURRAY: O Laes Grael, a Ana Moser, o Joaquim Cruz e a Paula têm trabalhos sociais muito bons. Há vários outros Atletas Olímpicos que fazem o mesmo. O pessoal do judô, o Flávio Canto, além de outros, também têm.